Assim foi feito. Rendeu-se ao calor de um mexicano picareta e arriscou raríssimas palavras em espanhol. Ficamos surpresas quando a madame chinesa nos ofereceu o melhor quarto da mansão por um preço razoável. Ficávamos no topo: com pia, geladeira, microondas, mesa, sofá, camas enormes e uma tv estragada. Ela pegou a janela. Eu, o escuro. Ela cozinha. Eu, limpo. Foi me receber com um prato de arroz (sempre arroz), ovo e um coração de ketchup. Tempo de gentilezas. Mess fazia do lado dela do quarto uma bagunça e cozinhava com poucas noções de higiene. O segredo, inclusive, das receitas era a minha fome aliada ao molho shoyo. Ela queria o amor. Nunca disse “eu te amo” e a possibilidade lhe dava arrepios. Todos os dias de manhã coloca os cílios postiços, a meia calça, a chapa no cabelo, aceitava a torrada com manteiga e tomava aquele chá. Eu pensei que pudesse encontrar uma grande amiga, mas nossas buscas eram diferentes. Muita simpatia, mas toda convivência um dia pega no calo. Do meio para o final, eu me sentia sozinha, Mess passava dias sem aparecer. Eu, cozinho. Eu, limpo. Ela encontrou um cara e a cama dele, estava tão feliz. O moço adiantou que de sério nada queria, estava decepcionada. Era uma moleca perdida, de riso fácil, emotiva, que experimentava as chances de amar. Rebelou-se contra a chinesa, nossa cozinha, a claridade da janela e o próprio coração. Despediu-se de mim em um dia de neve e ficou lá, em pé, até eu dobrar a esquina. Era a hora de Mess tomar o resto de chá e planejar a próxima mudança, de casa, cama e amor.
Caramba Ms. Ax. Bonito de verdade. Escreva mais.
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